terça-feira, 22 de julho de 2014

O encontro enigmático de Ana e Pedro

Na irrefutável necessidade do amor (já era quase primavera) Pedro e Ana marcaram um encontro galante, quando passavam e perpassavam no azul do Rio de Janeiro.
         Era bem manhãzinha.
         - As quatro em ponto me casarei contigo no mais alto beiral – disse Pedro.
         - Candelária? Perguntou a noiva.
         - Do lado norte. – respondeu ele.
         - Tá. – assentiu Ana, com alegria e pudor, pois as quatro azul em ponto, Ana pontualíssima chegava no beiral. Pedro? Pedro não.
         Ana que era branca se exagero, cantarolava, humilhada e ofendida com o atraso, contemplando acima do campanário todas as possibilidades da rosa-dos-ventos. Mas na paisagem do céu voavam, apenas, velozes andorinhas garotas, porque as velhas andorinhas enfileiravam-se cornijas, pensando na morte, como gente fina, lá dentro, nos dias solenes de missa de réquiem.
         Quatro e dez. Quatro e um quarto, Ana sozinha a mercê quem sabe de um ladrão, remoto, mas possível. Sol e sombra, como custa a passar um quarto de hora para uma noiva que espera o noivo no mais alto beiral. Como se humilha em revolta a noiva branca.
         Ah, Ana cantarolou de repente, quando distinguia, indignada, Pedro que chegara caminhando pelo beiral mais alto, do outro lado, lá onde, um pouco além, gritavam as esganadas gaivotas do mar pardo do mercado. Irônica, Ana pergunta:
         - Perdeste a noção do tempo?
         - Perdão, por Deus, perdão – respondeu Pedro:
         - Tardo mais ardo. Olha que tarde!
         - Que tarde – replicou Ana:
         - Sozinha aqui em cima!!!
         - A tarde era tão bonita – disse Pedro – A tarde estava tão bonita que era um crime vir de ônibus.
         - Mas e eu?! – Queixava-se Ana.

         - A tarde era tão bonita – explicou Pedro com doce paciência – que eu vim andando, tinha de vir andando, andando meu amor.

Imperfeição

Meus versos,
Veja só que pequinês.
Que fazer? – Sou ainda um aprendiz!
Meu estilo frágil nem se fez.
Falta um buril e a crítica de um juiz!
(Sou menor no erudito português)
Uma joia literária, nunca fiz...
Não faz mal! Tentarei mais de uma vez...
Um dia, talvez, serei feliz!
Que fazer, publicar o que já fiz, ou escondê-los entre a timidez?
Não sei!
Meus versos são tão pueris.
Versos nem sempre é tudo o que se diz:
Requer arte, é um jogo de xadrez

Com peças esmaltadas em verniz!

A deusa que habita em mim

Quando a lua cresce no céu, sou Ártemis dos bosques. Busco os caminhos virgens e neles mostro minha força em cada ramo. Sou Ártemis quando busco os montes e anseio por novos rumos, quando repudio os limites e não existe o medo. Sou Ártemis que me lanço sem amparo do cume feito com todas as pedras, que tentam, inúteis, bloquear meus atos deliciosamente insanos.
Assim sou Ártemis.
Quando no céu a lua é cheia, sou Deméter de coração nos olhos. Busco o amor imensurável e ofereço aquele que habita em meus infinitos braços. Sou Deméter quando procuro meu filho em cada ser, quando quero ser Ave mãe e ninho num só tempo. Sou Deméter quando meu colo se torna porto e suplica dolorosamente, pelo lançar de âncoras de todas as embarcações.
Assim sou Deméter.
Quando a lua míngua, sou Hécate de toda escuridão. Busco a linguagem da alma e descubro ser eu mesma tudo aquilo que me ameaça. Sou Hécate quando a solidão importa e quando o fim torna-se causa e razão. Sou Hécate quando penso na morte e encontro o que sou antes de tornar-me outra.
Assim sou Hécate.

Ensinando Poesia

Queres fazer poesia?
Pense numa mulher e a chame por Maria.
Maria é nome universal,
E simboliza todas as mulheres,
Tua poesia, assim, se torna impessoal.
Fala sempre numa linguagem simples como se estivesse conversando com um amigo;
Nada de se fazer erudito ou intelectual,
A poesia gostosa tem que ser coloquial.
Pense numa flor!
Lembra-te da rosa.
(... não é à toa que a rosa simboliza a poesia.)
Já viste coisa mais linda que a rosa?
Pensa na ternura!
(... toda poesia tem que ser terna.)
Lembra-te do beija-flor?
(... há coisa mais delicada que o colibri beijando seu amor?)
Começa a sonhar e manifestar o teu desejo.
(... poesia é sonho, não sabias?)
Não te importes muito com a métrica ou com a rima;
Elas costumam deturpar o nosso pensamento.
Solta uma rima aqui, outra acolá,
O suficiente para manter o ritmo;
A poesia deve ser melodiosa.
Isto feito, a poesia está pronta,
Só restando um bom final.
Às vezes, resumir é gostoso de ouvir:
A ternura – o beija-flor,
O ritmo – a melodia,
O desejo – o beijo – o amor,

Uma flor – Rosa – Maria.