Imagine o preto. Escuro, amplo, sem
começo, fim, forma ou lugar. Dá medo. O preto, eu conheço. Agora
me diga como é o azul. Dizem que o mar é azul e o céu também. Já
me afirmaram que o espaço é preto, mas pense bem, não há estrelas
lá? Astros, planetas... Em meu espaço, não vejo nada além do
preto. Todos concordam que o céu é lindo. Ainda mais quando coroado
pelo crepúsculo alaranjado que, junto a nuvens brancas, é definido
como azul celeste. Parece maravilhoso. Como é a cor laranja? Já
ouvi definirem como cor abóbora. A forma de uma abóbora não é
segredo algum, mas sua cor alaranjada é um mistério para mim. Até
porque, antes de amadurecer, a abóbora é verde. Interessante, como
você definiria o verde? Dizem que plantas, as matas e até algumas
partes do mar são verdes. Posso, então, deduzir que o verde e o
azul estão bem próximos. Na realidade, sei que ao misturar o azul
com o amarelo se obtém o verde. Sabe o que é incrível? Alguém me
contou que o sol é amarelo, mas ninguém pode olhar para ele sem
arriscar a perder a visão... Se perdesse a visão hoje, agora, você
saberia como são as cores? E se nunca tivesse enxergado nada, como
seria as cores para você?
Muito prazer, assim sou eu. Meu nome é
Tatu e nasci sem visão. Nunca enxerguei nada, além da escuridão.
Na realidade, meu nome é Matheus, Tatu é apelido, nem sei por quê.
Acho que é porque eu gostava muito de imitar um tatu – bola,
quando pequeno. Só que não faço idéia de como é um tatu de
verdade, nunca toquei em um. Minha mãe havia me dito que é um bicho
pequeno, que anda sobre quatro patas, corre muito, cava buracos e se
enrola como uma bola bem dura para que os outros animais não possam
lhe fazer mal. Assim é o meu tatu. A cara que ele tem? Não sei.
Minha mãe me ensinou muitas coisas, entre elas que eu sou especial.
Todo mundo é, mas ela sempre me fez sentir como se eu fosse o mais
especial de todos. Meu pai jogava futebol comigo, mas com bola de
verdade, não com tatu-bola. O mundo é assim, redondo como uma bola
gigante, azul. Olha a cor aí de novo!
Você já viu um saci? Ele nunca foi
visto por ninguém, pois não existe. Mas imagine que ele existe.
Como seria? Um menininho travesso, negro, com capuz e bermuda
vermelha e um cachimbo na boca! Enfim, como uma pessoa comum. Mas e
as outras características? Os detalhes? Como seria seu corpo?
Magrinho, gordinho? E o rosto? Para saber, precisa usar a imaginação.
As coisas para mim são como os sacis. Eu nunca os vi, na verdade,
nem sei se muitas delas existem, então preciso imaginá-las, algumas
posso tocar e sentir, é melhor para formar uma imagem. Era assim que
eu “via”
o rosto de minha mãe e do meu pai: com as mãos.
E o mundo? Como você o vê? Casas,
ruas, prédios, poluição e carros! Quer saber como eu imagino o
mundo? Pessoas, pessoas, pessoas e pessoas! Eu não necessito de
olhos para enxergá-las, na verdade quem os possui, talvez, não
possa vê-las como eu.
Você consegue definir a alegria? Sua
forma? Um sorriso, por exemplo, daqueles que se sente mais do que vê,
que contagia, envolve. Quer mais? Um olhar, não captado por olhos
carnais, corruptíveis e julgadores, mas pelos olhos da alma,
profundos, verdadeiros e sinceros. Se me sinto uma pessoa feliz?
Claro que sim, estou vivo! Sem a visão, mas com o tato, olfato,
paladar e a audição,e, tenho um coração que bate, sente, bate,
sente, bate...
Muitas coisas nunca saberei como são, a
não ser em minha imaginação. Ah! Mas esta eu conheço bem! Ela é
supercolorida! Talvez meu azul seja diferente do seu, assim como o
meu vermelho não é o real, já o meu preto, sim, é o verdadeiro.
De qualquer forma, posso afirmar que minhas cores são mais bonitas
que as suas! Sabe por quê? Porque são minhas, só minhas. Então,
aquilo que fazemos de melhor é melhor porque somos seus autores.
Logo, sua vida também poderá ser tão significante e maravilhosa
quanto a minha!
Basta enchê-la de cores...
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