Já ouvi
dizer que todo (aquele que se acha um) cronista tem seu dia. Inevitavelmente
ele chega. Arrebata a inspiração e o faz rabiscar páginas do que poderia ter
sido e evidentemente não foi. E como não costumo fugir às regras, eis que
chegou o meu dia! Falar da falta de assunto - convenhamos - parece até coisa do
velho Braga, mas é a verdade... Desde a manhã, sofro com a idéia de nada ter a
dizer.
Entrei no ônibus lotado. Mesmo desanimado, procurei algo de que poderia sair-me
uma crônica... Que ilusão! Nada que a valesse. E depois, este negócio de
lotação deixa o passageiro sem jeito, não é daí que surgem os bons textos. Bem
que eu poderia começar mais ou menos assim "Andar de ônibus é sempre um
divertimento, ainda mais quando está repleto de passageiros, etc". Não.
Não, o leitor que anda de ônibus me acharia irônico, e eu não quero parecer
inverossímil.
À tarde, no trabalho, alguém se lembrou de assoviar um samba-enredo,
demonstrando intimidade com o ritmo e, por que não, com a letra. Foi então que
pedi: - Ô, Lucas, canta um pedacinho da música para eu lembrar, por favor.
Na realidade, conhecia a canção, só estava mesmo interessado em escrever sobre
o ato: alguém que assoviava "explode coração na maior felicidade...",
enquanto trabalha para receber um salário nada cristão. Nova desilusão! Achei
que uma crônica sobre os baixos salários, além de monótona, poderia lembrar
artigos político, irreverência, pessimismo ou coisa que o valha! E o que isso
tem a ver com o samba?
É noite. Se ao menos uma lua branca ofuscasse as lâmpadas da rua, eu odiaria
escrever algo sobre o luar... Acho que estou ficando muito romântico para o
momento em que vamos... E então? Ninguém observa a palidez da lua no século
XXI? Mais rabiscos... Ridículos!
Ora, não era nada disso que eu tencionava dizer... é que esse brilho penetra a
alma; mas estou lúcido, não sou poeta, nem leio nada da belle époque. Para o bem do leitor vai passar.
Assim espero.
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