Os turnos ininterruptos de revezamento tiveram
origem na Lei 5.811/72 que estabelece a jornada de trabalho dos
empregados nas atividades de exploração, perfuração, produção e refinação de
petróleo.
O trabalho em turno é aquele em que grupos de trabalhadores
se sucedem nos mesmos locais de trabalho, cumprindo horários que permitam o
funcionamento ininterrupto da empresa.
Desta forma, considera-se que um trabalhador
desenvolve suas atividades em turnos ininterruptos de revezamento quando sua
jornada de trabalho abrange o dia e noite, ou seja, devido à escala de serviço,
ora é realizada na parte da manhã, ora na parte da tarde e ora na parte da
noite.
Como
se pode perceber a configuração dos turnos ininterruptos de revezamento tem
haver tanto como a forma de serviço da empresa, que deve ser ininterrupta,
quanto com a jornada de serviço do empregado, que deve abranger tanto o dia,
quanto a noite.
Trata-se, por exemplo, dos empregados do setor de montagem
de automóveis que tendo em vista a atividade ininterrupta da empresa, alternam
seus turnos de serviço, mediante uma escala de revezamento, ora prestando suas
atividades da 06:00h. as 12:00, das 12:00 as 18:00, das 18:00 as 24:00 e de
00:00 as 06:00.
Assim, para estes empregados, a duração da
jornada trabalho está limitada a 06 horas diárias.
Constituição
Federal
XIV - jornada de seis horas para o trabalho
realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva;
É que o regime especial de jornada para o
trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento tem como objetivo
precípuo tentar proteger a saúde do empregado, vez que este tipo de jornada de
trabalho, abrangendo várias horas do dia e da noite, ou seja, ora na parte da
manhã, ora na parte da tarde, e ora na parte da noite, traz um desgaste muito
maior para o trabalhador, que as jornadas convencionais.
E desta forma, o nosso ordenamento jurídico
impõe uma limitação na duração da jornada, tendo em vista o maior desgaste
sofrido.
Desgaste este, que representa a razão de existir
deste tipo de proteção.
Neste sentido, em se configurado os Turnos
ininterruptos de revezamento, as horas trabalhadas que ultrapassarem a sexta
hora deve ser remunerada como extra.
Turno ininterrupto de trabalho é aquele que o
empregado, durante determinado período, trabalha em constante revezamento. O
que caracteriza o turno não é o trabalho contínuo em um dia, mas sim o
constante revezamento de horário do empregado. Portanto, um empregado que
esteja a cada turno em horário diferente, com enorme desgaste para sua saúde.
Para estes casos, muito usado em empresas que
tenham atividades que necessite de operações nas 24 horas do dia, como por
exemplo caldeiras, fornos de queima e forno de fundição, a Constituição Federal
limitou a jornada em, no máximo 06h00 por dia (art. 7º XIV), salvo negociação
coletiva, ou seja, alteração do horário com a interferência do sindicato da
categoria do empregado.
1. - Desde meados de 2003, quando o Tribunal
Superior do Trabalho proferiu decisão, não unânime, acerca da jornada de
trabalho nos turnos ininterruptos de revezamento, mediante interpretação
bastante restritiva do art.7º, XIV, da CRFB/88, temos tido vontade de comentar
a questão. A oportunidade surgiu agora com consulta específica de um cliente.
2. - Em primeiro lugar, é importante definir o
que se entende por “turnos ininterruptos de revezamento”. Há quem acredite ser
imprescindível que o empregado atue nos 3 diferentes horários (manhã, tarde e
noite), pois só assim estaria configurado o rodízio típico, que altera a rotina
e o relógio biológico do trabalhador. Vejamos algumas decisões ilustrativas:
“Horas extras - Turnos ininterruptos de
revezamento – Configuração – Para que se configure o turno ininterrupto de
revezamento, mister que o trabalhador labore, dentro do mesmo mês, de manhã, de
tarde e de noite: em três jornadas diferentes, portanto.” (TRT da 3ª Região - RO nº 13554/99 – Juiz relator Rodrigo Ribeiro Bueno
– DJMG in 4.3.2000) “HORAS EXTRAS. TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO. HORÁRIO
FIXO. Como bem pondera Maurício Godinho Delgado, referindo-se ao turno
ininterrupto de revezamento, "A situação enfocada pela Constituição
configura-se caso o trabalhador labore ora essencialmente pela manhã, ora
essencialmente pela tarde, ora essencialmente pela noite - por ser flagrante a
agressão que semelhante sistemática de organização laboral impõe ao organismo
do trabalhador. É a essa sistemática de trabalho que a Constituição pretendeu
atingir, reduzindo o desgaste do trabalhador, ao proporcionar-lhe jornada mais
estreita de trabalho."
Confessando o obreiro que durante todo
contrato de trabalho teria laborado por quatro anos no terceiro turno e até o
seu desligamento no primeiro, resta caracterizado que esse turno foi de forma
fixa, devendo ser a sua jornada aquela prevista no art. 7º, inciso XIII, da
Carta Magna (oito horas diárias ou quarenta e quatro semanais), não a reduzida,
privilegiada para os turnos inegavelmente ininterruptos. Recurso a que se dá
provimento para excluir da condenação as horas extras e reflexos acima da sexta
diária.” (TRT da 18ª Região – RO nº 01692-2003-001-18-00-2 - Juíza Relatora
Ialba Luza Guimarães De Mello - Publicação: DJE nº 14.445 do dia 1º.2.2005,
pág. 44.) “Turno ininterrupto de revezamento. Caracterização. Não se pode falar
em turno ininterrupto de revezamento quando este é semanal e diurno. O que a
lei procura proteger é a saúde física do trabalhador, que não é afetada por tal
horário laboral, já que a agressão ao seu relógio biológico ocorre com a
alteração de jornadas, em que se inclui o trabalho noturno(...)” (TRT da 17ª
Região – Acórdão nº 1788/2000 – RO nº 861/99 – Juíza Relatora Maria Francisca
dos Santos Laceda).”
3. Há, entretanto, opinião diversa, no sentido
de que, para se configurar o turno ininterrupto de revezamento, é a empresa que
deve trabalhar 24 horas, sem parar, independentemente de o empregado atuar
ou não nos 3 turnos. Se o empregador tem atividade constante, então já bastaria
para caracterizar o esquema de turno ininterrupto:
“TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. A caracterização
da existência de trabalho em turnos ininterruptos de revezamento, segundo a
previsão constitucional, exige que a atividade produtiva da empresa seja feita
de forma contínua, com turnos abrangendo as 24 horas por dia, que haja
distribuição dos horários de trabalho em turnos para cobrir todo o período de
atividade da empresarial e que o trabalho desenvolvido do empregado seja feito
em escala de revezamento semanal.
Quando o empregado trabalha em escala de
revezamento semanal, como na hipótese, com prestação de serviço em uma semana
no horário diurno e em outra semana no horário noturno, fica caracterizado o
regime de trabalho de revezamento, não importando se labora em dois ou
três turnos, pois, em qualquer destes casos, há variação permanente de horário
de trabalho e alteração do ciclo biológico do trabalhador. Recurso parcialmente
provido.” (TRT da 19ª Região - RO nº
00881-2004-056-19-00-1 - Tribunal Pleno – Juiz Relator José Abílio - Decisão em
23.11.2004– DJ in 29.11.2004).
“TURNO
ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO - LABOR EM DOIS TURNOS - NÃO DESCARACTERIZAÇÃO - O fato de se ativar o empregado em apenas dois turnos
de revezamento não afasta a incidência do disposto no art.7º, XIV, da Carta
Magna, sendo devidas como extraordinárias as horas laboradas após a 6ª diária.”
(TRT 2ª Região – Processo nº 02970458009 – Acórdão nº 02980503392 – 7ª Turma -
Julgado em 21.9.1998 - Juíza Relatora Gualdo Fórmica – DJ in 16.10.1998)
4. - Filiamo-nos à ideia de que é o trabalho em
turnos diversos, com alternância de horário e prejuízo à rotina biológica e
familiar, que configura, para o trabalhador, a caracterização do turno
ininterrupto de revezamento. Se só a empresa atua 24 horas, mas o empregado
labora em horário fixo, sem rodízio, não vislumbramos essa configuração.
5. - Pois bem, estando o empregado sujeito ao
efetivo esquema de turno ininterrupto de revezamento, passamos a analisar a
questão da jornada de trabalho praticada nesse sistema.
6. - O artigo 7º, XIV, da Constituição Federal
trata do tema e autoriza a alteração da carga de 6 horas diárias, desde que por
meio de negociação coletiva:
“Art. 7º - São direitos dos
trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua
condição social:
(...)
XIV - jornada de seis horas para o
trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação
coletiva.”
7. - Pela leitura isolada do dispositivo
constitucional, tem-se a ideia de que as empresas não precisam pagar pelas
horas excedentes à sexta trabalhada, se houver instrumento coletivo prevendo a
alteração da jornada. Aliás, esse sempre foi o entendimento clássico e natural,
como se observa em algumas ementas transcritas abaixo:
“A prorrogação da jornada somente será
permitida se prevista em acordo coletivo (...) poderá a empresa que adota
turno ininterrupto de revezamento acordar jornada normal de trabalho superior a
6 horas diárias, sem que sejam essas horas excedentes remuneradas com qualquer
acréscimo.” (Vianna, Cláudia Salles Vilela – Manuel Pratico das Relações
Trabalhistas – 6ª Ed. – São Paulo – LTR, 2004 – página 589/590) ‘Turnos de
Revezamento – Acordo coletivo – Validade do texto constitucional – É expresso
em excepcionar a jornada especial de 6 (seis) horas para os turnos
ininterruptos de revezamento, mediante negociações coletivas – Inciso XIV,
parte final, do artigo 7º. Em havendo o ajuste coletivo, fruto da
negociação coletiva, e não restando questionada a sua violação, não prospera o
deferimento das horas extras, com base na jornada de 6 horas.” (TRT da 15ª
Região – Acórdão nº 045306/2001 – ROS nº 012580/2000 – Decisão em 22.10.2001 –
Primeira Turma – Juiz Relator Luiz Antônio Lazarim - DOE in 22.10.2001) “Recurso
provido parcialmente para excluir da condenação imposta à reclamada as horas
extras do período de 1.10.1996 a 07.07.1997, haja vista que no referido período
existia acordo coletivo que autorizava a jornada de 8 horas para os
trabalhadores que laboravam em turnos ininterruptos de revezamento” (TRT
da 17ª Região – Acórdão nº 1449/2000 – RO nº 5336/1998 – Decisão em 15.07.2000
–– Juiz Relator Miguel Brotto Dórea).”
8. - Todavia, outros Tribunais Regionais
entendem a questão de forma diferente, prestigiando não a negociação coletiva
em si, mas, ao contrário, a saúde do trabalhador e o convívio familiar, que
ficariam sobremaneira afetados com o trabalho em turnos alternados. Sob essa
ótica, não se poderia admitir que as horas excedentes à sexta fossem
remuneradas de modo normal, sem a incidência do adicional extraordinário:
“Turnos de Revezamento – Negociação
Coletiva – Limite. A despeito de acordo coletivo que declare o turno de
revezamento, ao empregado que labora revezando-se em horários
ininterruptos frequentemente alterados são devidas como extras as horas
laboradas após a sexta diária, pois a negociação coletiva tem limites, não
podendo prever disposições que possam vir a causar prejuízos à saúde do
trabalhador. (TRT da 24ª Região – RO nº 948-2003-002-24-08 – Decisão em
31.3.2004 – Tribunal Pleno – Juiz Relator Tomás Bawden de Castro Silva – DJ in
21.5.2004) “Turnos Ininterruptos de Revezamento – Jornada de Oito horas –
Negociação Coletiva – Horas Extraordinárias – A constituição federal autoriza
que sindicatos e empresas celebrem norma coletiva prevendo
jornada de até oito horas para trabalhadores sujeitos a turnos
ininterruptos de revezamento, devendo, entretanto, a sétima e a oitava horas
ser consideradas horas extraordinárias e como tal remuneradas”. (TRT da 8
Região – RO nº 5363/1999 - Decisão em 9.2.2001 – Terceira Turma).
9. - Já outras decisões demonstram que as empresas
podem, sim, por meio de um instrumento coletivo, majorar a jornada de 6 horas,
mas desde que observem o limite semanal de 36 horas:
“TURNO
ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO. PREVISÃO EM INSTRUMENTO COLETIVO. Descabidos
os argumentos da reclamada objetivando viabilizar o labor em sobrejornada por
meio do acordo pactuado, porquanto a norma constitucional, ao se referir à
negociação coletiva (aceitável o acordo), como forma de flexibilizar os turnos
ininterruptos de revezamento, não autorizou, qualquer renúncia do benefício com
o pagamento de horas extras para remunerar a jornada elastecida. A
negociação fica limitada, a meu ver, à observância, sempre, da jornada semanal
em 36 horas, sob pena de esvaziar a tutela constitucional". (TRT da
9ª Região- RO nº 11852/2000- Acórdão nº 04123/2001-2000, Juíza Relatora
Rosemarie Diedrichs Pimpão – DJPR in 09-02-2001.”
10. - Esse posicionamento anterior foi
exatamente o adotado pelos Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios
Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, em julgamento ocorrido em
setembro de 2003:
EMBARGOS.
TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. VALIDADE. JORNADA SUPERIOR A 6 HORAS
FIXADA EM ACORDO COLETIVO. IMPOSSIBILIDADE. EXTRAPOLAÇÃO DA JORNADA DE 36 HORAS
SEMANAIS. PREJUDICIALIDADE. SAÚDE. EMPREGADO.
O artigo 7º, inciso XIV, da Lei Maior,
ao contemplar a jornada de trabalho em turnos ininterruptos de revezamento de 6
horas diárias, permitiu sua ampliação por meio de negociação coletiva.
Essa possibilidade de alteração de jornada, contudo, não é ilimitada, pois
deve ser observada a compensação ou concessão de vantagens ao empregado. Nunca,
porém, a eliminação do direito à jornada reduzida, como se verifica na
hipótese.
O Acordo Coletivo pode estabelecer
turnos ininterruptos de revezamento com jornadas superiores a seis horas, como
ocorreu, desde que se observe o limite de 36 horas semanais, pois o limite
semanal representa para o empregado a garantia de higidez física, uma vez que a
redução do labor em turno ininterrupto de revezamento decorre de condições mais
penosas à saúde.
O Acordo Coletivo em exame, ao fixar
duração do trabalho de 8 horas e 44 semanais, contrariou as disposições de
proteção ao trabalho, porquanto descaracterizou a jornada reduzida vinculada ao
turno ininterrupto de revezamento, que é assegurada constitucionalmente pelo
limite semanal de 36 horas.
Recurso de Embargos não conhecido. Vistos,
relatados e discutidos estes autos de Embargos em Recurso de Revista nº
TST-E-RR-435/2000-003-15-00.0, em que é Embargante PIRELLI CABOS S.A. e
Embargado RONALDO APARECIDO ROQUE.
A 4ª Turma desta Corte, por intermédio do
Acórdão de fls.180/184, afastou a aplicabilidade do rito sumaríssimo, porque a
ação foi proposta antes da edição da Lei nº 9.957/2000, e não conheceu da
Revista do Reclamado quanto ao tema turno ininterrupto de
revezamento/negociação coletiva. Inconformado, o Reclamado interpõe Embargos à
Seção Especializada em Dissídios Individuais (fls.186/195), com fundamento no
artigo 894 da CLT. A impugnação não foi apresentada. Os autos não foram
remetidos ao Ministério Público do Trabalho.
É o relatório. V O T O -
CONHECIMENTO Satisfeitos os pressupostos comuns de admissibilidade,
examino os específicos dos Embargos.
10.1 TURNOS
ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. VALIDADE. JORNADA SUPERIOR A 6 HORAS FIXADA EM
ACORDO COLETIVO. IMPOSSIBILIDADE. EXTRAPOLAÇÃO DA JORNADA DE 36 HORAS SEMANAIS.
PREJUDICIALIDADE. SAÚDE. EMPREGADO.
A Turma não conheceu do Recurso de Revista do
Reclamado por entender que o acordo coletivo da categoria, que fixava duração do
trabalho de 8 horas diárias e 44 semanais, não podia prevalecer, porquanto não
estabelecia melhorias salariais e sociais em contrapartida. Assentou à fl. 183:
(...)
Quanto à Orientação Jurisprudencial nº 169 da
SBDI-1/TST, por igual não a tenho como contrariado. O Eg. Regional de forma
clara aponta a extrapolação da jornada de trinta e seis horas semanais ao
consignar o cumprimento de quarenta e quatro horas. Assim, não afastou a
validade da negociação coletiva, no sentido do aumento da jornada diária de
seis horas, concluindo devidos os adicionais de horas extras sobre a jornada
excedente àquela definida como compatível ao exercício do trabalho em
turno ininterrupto de revezamento. Admitir-se que a jurisprudência iterativa,
assim como o ordenamento maior tenha autorizado, pela via negociação coletiva,
a adoção da jornada de oito horas diárias, sem remuneração, implicaria em
descaracterização da jornada reduzida e do turno ininterrupto de revezamento,
este fulcrado em trabalho mais penoso à saúde e à proteção do trabalhador.
O Reclamado sustenta que o não-conhecimento da
Revista viola os artigos 896, alínea a, da CLT e 7º, incisos XIV e XXVI, da
atual Carta Política, porque o acordo coletivo da categoria é válido e permitiu
a ampliação da jornada de trabalho do empregado submetido ao turno ininterrupto
de revezamento, independentemente do pagamento das 7ª e 8ª horas
extraordinárias. Aponta contrariedade ao disposto no item nº 169 da Orientação
Jurisprudencial da SDI-1, bem como indica arestos ao confronto de teses.
O Recurso não se viabiliza por divergência
jurisprudencial, porque não foi conhecido, não havendo tese a ser
contrastada. Inservíveis os arestos de fls.192/194. A pretensão do
Reclamado em obter a validade do Acordo Coletivo da categoria, que fixou
duração do trabalho de 8 horas e 44 semanais ao trabalhadores sujeitos ao turno
ininterrupto de revezamento, desafia o princípio de justiça social, notadamente
no que concerne às regras de proteção à saúde física e mental do empregado,
porque o intuito do legislador constituinte, no artigo 7º, inciso XIV, ao
instituir jornada reduzida, foi o de proteger os trabalhadores das indesejáveis
e prejudiciais consequências do labor em turnos ininterruptos de revezamento.
O artigo 7º, inciso XIV, da Lei Maior, ao
contemplar a jornada de trabalho em turnos ininterruptos de revezamento de 6
horas, permitiu sua ampliação por meio de negociação coletiva. Essa
possibilidade de alteração de jornada, contudo, não é ilimitada, pois deve ser
observada a compensação ou concessão de vantagens ao empregado. Nunca, porém, a
eliminação pura e simples do direito à duração reduzida do trabalho, como se
verifica na hipótese. O Acordo Coletivo pode estabelecer turnos ininterruptos
de revezamento com jornadas superiores a seis horas, como ocorreu, desde que se
observe o limite constitucional de 36 horas semanais, pois o limite semanal
representa para o empregado a garantia de higidez física e mental, uma vez que
a redução do labor em turno ininterrupto de revezamento decorre de condições
mais penosas à saúde.
Nesse contexto, o Acordo Coletivo pactuado, ao
fixar duração do trabalho de 8 horas diárias e 44 semanais, contrariou as
disposições de proteção ao trabalho, na medida em que descaracterizou a jornada
reduzida vinculada ao turno ininterrupto de revezamento, que é assegurada
constitucionalmente pelo limite semanal de 36 horas. Não se constata, ademais,
contrariedade ao disposto no item nº 169 da Orientação Jurisprudencial da
SDI-1, porquanto não se afastou a validade da negociação coletiva, quanto ao
aumento da jornada de seis horas. Somente é inválida a duração do trabalho
normal superior a trinta e seis horas semanais constatada pelo Regional, uma
vez que lesiva à saúde do trabalhador que labora em turnos ininterruptos de revezamento.
Incólume o artigo 7º, incisos XIV e XXVI, da
Constituição vigente. Não conheço. ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Subseção
I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por
maioria, não conhecer dos Embargos, vencidos os Exmos. Ministros Vantuil
Abdala, Rider Nogueira de Brito e João Batista Brito Pereira. Brasília, 22 de
setembro de 2003. CARLOS ALBERTO REIS DE PAULA Relator (Tribunal Superior do
Trabalho - E-RR - 435/2000-003-15-00 - Ministro Relator Carlos Alberto Reis de
Paula - DJ in 25/06/2004)
11. - No julgamento que gerou o acórdão acima,
houve divergência por parte dos Ministros Vantuil Abdala, Rider Nogueira de
Brito e João Batista Brito Pereira, com base na alegação de que a regra
disposta no artigo 7º, inciso XIV, traz uma hipótese clara de exceção, que
prevê a negociação. Uma preocupação dos referidos magistrados vencidos foi a de
não se poder presumir que a negociação é sempre falha e maléfica ao
trabalhador.
Seria preciso provar que os empregados perderam
direitos, que foram forçados a aceitar o acordo coletivo, sem qualquer
barganha, sem o recebimento de vantagens outras, até mesmo, quem sabe, a
preservação dos postos de trabalho. Só com a análise das circunstâncias fáticas
da própria negociação é que se poderia invalidar a cláusula do instrumento
coletivo e determinar o pagamento das horas extras. Foi esse, em síntese, o
posicionamento dos votos vencidos, com o qual concordamos.
12. - Não obstante, é certo que aquele acórdão
do C. TST já serviu como precedente em outro caso julgado perante aquele
Tribunal, além de recentíssima decisão do E. TRT Gaúcho, publicada em
29/07/2005, conforme se verifica abaixo, respectivamente:
“RECURSO DE REVISTA.
TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO. FIXAÇÃO DE JORNADA SUPERIOR A SEIS HORAS
MEDIANTE NEGOCIAÇÃO COLETIVA.NÃO OBSERVÂNCIA AO LIMITE SEMANAL DE 36 HORAS.
NEGÓCIO JURÍDICO DESPROVIDO DE VALIDADE.” A
igualdade, a confiança e o respeito pela dignidade e integridade física e moral
do trabalhador são resguardadas, quando os preceitos constitucionais e os
princípios que os norteiam são postos em prática. Neste sentido, já se firmou
esta Corte, suplantando o aresto trazido pela Reclamada em seu recurso de
revista.
A Seção de Dissídios Individuais 1, no Processo
TST-ERR-435/2000-003-15.00.0, tendo como relator o Ministro Carlos Alberto Reis
de Paula, decidiu que o acordo coletivo de trabalho, ao fixar turnos
ininterruptos de revezamento, deve atender o limite de 36 horas semanais.
Destacou aquela Corte que não se afasta a possibilidade e validade de
negociação coletiva sobre os turnos aludidos, todavia, era indispensável
observar o limite constitucional de 36 horas semanais.
Tendo o Regional condenado a Reclamada ao
pagamento das horas extras excedentes da 6ª diária, com o adicional de 50%
porque o Reclamante trabalhava 8 horas por dia e 42 semanais, aplicou à espécie
os arts. 7º, XIV e XXVI, da Constituição Federal, bem como a Orientação
Jurisprudencial nº 169 da SDI 1 do TST. Recurso conhecido e não provido.”
(Tribunal Superior do Trabalho - Recurso de Revista nº 691327/2000 – 1ª Turma –
DJ in 14.11.2003) “Recurso ordinário da reclamada. Recurso adesivo do autor.
Matéria comum. Horas extras e reflexos. a) Turnos ininterruptos de
revezamento. A expressão salvo negociação coletiva constante do artigo 7º,
inciso XIV, da Carta Magna não tem o condão de permitir o elastecimento da
jornada semanal de 36 horas semanais, autorizando, apenas, a adoção de regime
de compensação horário, desde que observada tal limitação temporal.
Hipótese em que inobservada a finalidade última
de tal dispositivo constitucional, qual seja, proteger os trabalhadores
sujeitos a trabalho mais penoso, decorrente das sucessivas alterações horárias
a que expostos. Apelo do autor que se acolhe para determinar sejam consideradas
extras as horas laboradas a contar da 6ª diária. (...) (TRT da 4ª Região –
Processo nº 10354-2004-561-04-00-3 (RO) – Juiz Relator João Pedro Silvestrin -
Data de Publicação: 29/07/2005).
13. - Vemos que o Tribunal Superior do Trabalho
(seguido recentemente pelo da 4a Região) vem fazendo uma interpretação
restritiva do dispositivo constitucional, para entender que a Constituição
Federal permitiu a ampliação da jornada de 6 horas no turno ininterrupto, por
meio de negociação coletiva, mas desde que seja observada a carga semanal de 36
horas, em respeito à saúde física e mental do trabalhador que opera em turno de
revezamento. Essa ressalva de limitação semanal não consta expressamente do
artigo, mas tem sido a tônica das decisões do Tribunal Superior.
14. - E vale lembrar ainda a redação da
Orientação Jurisprudencial nº 169, mantida pelo C. TST, que repete o artigo da
Constituição, também sem qualquer menção à limitação de carga semanal:
“Quando há na empresa o sistema de turno
ininterrupto de revezamento, é válida a fixação de jornada superior a seis
horas mediante a negociação coletiva”.
15. - Segundo o Tribunal Superior do Trabalho,
não haveria qualquer conflito entre a OJ e as recentes decisões proferidas pela
Corte, o que é até uma manifestação de coerência, pois, de fato, a OJ apenas
repete o artigo constitucional, que vem sendo interpretado com base na
existência de uma ressalva semanal de 36 horas. Concordando ou não com a
posição, é certo que o que vale para o artigo 7º, XIV, tem que valer para a OJ,
pois os textos são praticamente idênticos.
16. - Em que pese o entendimento do TST, como
não há obrigação legal de obediência hierárquica, muitos Regionais continuam
decidindo de forma contrária e prestigiando a negociação coletiva realizada. Como
exemplo, citamos recente acórdão do Tribunal Regional da 2ª Região (São Paulo),
cujo relator foi o professor e magistrado Sérgio Pinto Martins:
“Turnos ininterruptos. Negociação
Coletiva. O inciso XIV do artigo 7º da Lei Maior exige apenas negociação coletiva
para aumentar a jornada nos turnos ininterruptos. Não se fala em compensação
para o aumento de jornada, apenas a participação do sindicato da
categoria” (TRT da 2ª Região – Acórdão nº 2005027694 – Processo nº
00104-2003-491-02-00 – Decisão em 05.05.2005 – Segunda Turma – Juiz Relator
Sérgio Pinto Martins – DOE/SP, in 24.5.2005).”
17. - Diante da polêmica jurisprudencial, as
empresas devem estar cientes dos riscos da adoção de um turno ininterrupto cuja
jornada semanal seja superior a 36 horas, pois o C. TST vem privilegiando a
saúde do trabalhador e o desgaste físico e emocional que o rodízio traz, com a
condenação em horas extras de todas aquelas que ultrapassarem esse teto.
18. - Não concordamos com essa interpretação,
pois o artigo constitucional não traz essa limitação semanal, sendo que, a
nosso ver, o entendimento do TST acaba desvalorizando a negociação coletiva e
até pondo em risco a segurança jurídica das relações, pois, no passado, a
celebração de um instrumento coletivo para aumento da jornada nos turnos era
corrente e pacífico. Um advogado que outrora assessorou a empresa na
negociação, com base em norma constitucional, não sabe como explicar ao cliente
a condenação em pagamento de horas extras inimagináveis tempos atrás. Essa
incerteza que assola o país, seja na ciranda financeira, na política, no
judiciário, traz prejuízos morais sérios.
19. - Se se quer demonstrar preocupação, mais
que louvável, com a saúde do trabalhador, que se promova a alteração no texto
constitucional, ou até na redação da OJ 169, o que seria mais rápido por ora
(apesar de possível inconstitucionalidade material), mas que essa mudança
“legislativa” não afete situações pretéritas, passando a valer somente para o
futuro, propiciando a adequação das empresas à nova realidade. Muito embora a
imposição de nova ordem constitucional produza efeitos de imediato, que se
preveja a vigência a partir de determinada data.
20. - No máximo, na pior das hipóteses, que se
anulem, hoje, apenas os instrumentos coletivos comprovadamente negociados de
forma falha, com coação, sem a concessão de qualquer vantagem ao trabalhador
que teve a jornada no turno aumentada. Sem essa prova do vício, o que não pode
ser presumido em hipótese alguma, pois a boa-fé, sim, se presume e não o
contrário – apesar de o cenário político motivar pensamento diferente –, há que
serem respeitados os pactos coletivos, celebrados com intermediação de
sindicatos organizados e legitimados a tanto.
21. - Recomendamos às empresas que querem
continuar acreditando na negociação verdadeira e na adoção de turnos superiores
a 36 horas semanais, a cautela de incluir no corpo do instrumento coletivo os
motivos da transação, os bastidores econômicos-políticos, as vantagens “x”, “y”
e “z” recebidas pelos trabalhadores etc. Pelo menos será uma tentativa de
prova, com base nos argumentos vencidos dos Ministros Vantuil Abdala, Rider
Nogueira de Brito e João Batista Brito Pereira, de que não houve coação, mas,
ao revés, uma barganha favorável aos empregados.
22. - Por fim, lembramos, ainda, a necessidade
de concessão de intervalo de 1 hora para almoço e descanso, nos termos do
art.71 da CLT. O fato de ser um turno ininterrupto não quer dizer que o
intervalo é suprimido, mas sim que a atividade empresarial é constante. Não é a
jornada que é ininterrupta, como defendiam alguns, mas o esquema de alternância
de equipes de trabalho é que não para. Aliás, na própria jornada reduzida de 6
horas, há o intervalo de 15 minutos, consoante art.71, §1º, da CLT. Ou seja,
mesmo trabalhando 6 horas no turno ininterrupto, a jornada já seria
interrompida ao menos 15 minutos, o que, por óbvio, não descaracterizaria o
sistema. O TST tem a Súmula 360 a respeito, que aliás incorporou a antiga OJ
78:
Súmula nº 360 - Turnos ininterruptos de
revezamento. Intervalos intrajornada e semanal. A interrupção do trabalho
destinada a repouso e alimentação, dentro de cada turno, ou o intervalo para
repouso semanal, não descaracteriza o turno de revezamento com jornada de 6
(seis) horas previsto no art. 7º, XIV, da CF/1988. (Res. 79/1997, DJ
13.01.1998)
23. - Concluímos, portanto, respeitando demais
a preocupação com a saúde mental e física do trabalhador que é sobrecarregado
com o trabalho em horários alternados, em benefício da empresa e da própria
sociedade, a qual usufrui os serviços 24 horas, sem se dar conta do homem que
esteve batalhando por trás daquele conforto. Todavia, enquanto não houver regra
constitucional que abarque essa proteção, somos pela segurança jurídica das
relações e pelo respeito àqueles que acreditaram estar cumprindo a lei em um
país já tão carente dessa conduta.
*
ESTE ARTIGO FOI REDIGIDO MERAMENTE PARA FINS DE INFORMAÇÃO E DEBATE, NÃO
DEVENDO SER CONSIDERADO UMA OPINIÃO LEGAL PARA QUALQUER OPERAÇÃO OU NEGÓCIO
ESPECÍFICO.
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